terça-feira, 8 de maio de 2012
Portugal visto de fora
Portugal visto de fora
Um artigo de Jacques Amaury, sociólogo e filósofo francês, professor
na Universidade de Estrasburgo, a ler com olhos de ler.
"Portugal atravessa um dos momentos mais difíceis da sua história que
terá que resolver com urgência, sob o perigo de deflagrar crescentes
tensões e consequentes convulsões sociais.
Importa em primeiro lugar averiguar as causas. Devem-se sobretudo à má
aplicação dos dinheiros emprestados pela CE para o esforço de adesão e
adaptação às exigências da união.
Foi o país onde mais a CE investiu "per capita" e o que menos proveito
retirou. Não se actualizou, não melhorou as classes laborais, regrediu
na qualidade da educação, vendeu ou privatizou mesmo actividades
primordiais e património que poderiam hoje ser um sustentáculo.
Os dinheiros foram encaminhados para auto-estradas, estádios de
futebol, constituição de centenas de instituições público-privadas,
fundações e institutos, de duvidosa utilidade, auxílios financeiros a
empresas que os reverteram em seu exclusivo benefício, pagamento a
agricultores para deixarem os campos e aos pescadores para venderem as
embarcações, apoios estrategicamente endereçados a elementos ou a
próximos deles, nos principais partidos, elevados vencimentos nas
classes superiores da administração pública, o tácito desinteresse da
Justiça, frente à corrupção galopante e um desinteresse quase total
das Finanças no que respeita à cobrança na riqueza, na Banca, na
especulação, nos grandes negócios, desenvolvendo, em contrário, uma
atenção especialmente persecutória junto dos pequenos comerciantes e
população mais pobre.
A política lusa é um campo escorregadio onde os mais hábeis e
corajosos penetram, já que os partidos cada vez mais desacreditados,
funcionam essencialmente como agências de emprego que admitem os mais
corruptos e incapazes, permitindo que com as alterações governativas
permaneçam, transformando-se num enorme peso bruto e parasitário.
Assim, a monstruosa Função Publica, ao lado da classe dos professores,
assessoradas por sindicatos aguerridos, de umas Forças Armadas
dispendiosas e caducas, tornaram-se não uma solução, mas um factor de
peso nos problemas do país.
Não existe partido de centro já que as diferenças são apenas de
retórica, entre o PS (Partido Socialista) e o PSD (Partido Social
Democrata), de direita, agora mais conservador ainda, com a inclusão
de um novo líder, que tem um suporte estratégico no PR e no tecido
empresarial abastado. Mais à direita, o CDS (Partido Popular), com uma
actividade assinalável, mas com telhados de vidro e linguagem publica,
diametralmente oposta ao que os seus princípios recomendam e
praticarão na primeira oportunidade. À esquerda, o BE (Bloco de
Esquerda), com tantos adeptos como o anterior, mas igualmente com uma
linguagem difícil de se encaixar nas recomendações ao Governo, que
manifesta um horror atávico à esquerda, tal como a população em geral,
laboriosamente formatada para o mesmo receio. Mais à esquerda, o PC
(Partido comunista) menosprezado pela comunicação social, que o coloca
sempre como um perigo latente e uma extensão inspirada na União
Soviética, oportunamente extinta, e portanto longe das realidades
actuais.
Assim, não se encontrando forças capazes de alterar o status, parece
que a democracia pré-fabricada não encontra novos instrumentos.
Contudo, na génese deste beco sem aparente saída, está a impreparação,
ou melhor, a ignorância de uma população deixada ao abandono, nesse
fulcral e determinante aspecto. Mal preparada nos bancos das escolas,
no secundário e nas faculdades, não tem capacidade de decisão, a não
ser a que lhe é oferecida pelos órgãos de Comunicação. Ora e aqui está
o grande problema deste pequeno país; as TVs as Rádios e os Jornais,
são na sua totalidade, pertença de privados ligados à alta finança, à
industria e comercio, à banca e com infiltrações accionistas de vários
países.
Ora, é bem de ver que com este caldo, não se pode cozinhar uma
alimentação saudável, mas apenas os pratos que o "chefe" recomenda.
Daí a estagnação que tem sido cómoda para a crescente distância entre
ricos e pobres.
A RTP, a estação que agora engloba a Rádio e TV oficiais, está
dominada por elementos dos dois partidos principais, com notório
assento dos sociais-democratas, especialistas em silenciar posições
esclarecedoras e calar quem levanta o mínimo problema ou dúvida. A
selecção dos gestores, dos directores e dos principais jornalistas é
feita exclusivamente por via partidária. Os jovens jornalistas, são
condicionados pelos problemas já descritos e ainda pelos contratos a
prazo determinantes para o posto de trabalho enquanto, o afastamento
dos jornalistas seniores, a quem é mais difícil formatar o processo a
pôr em prática, está a chegar ao fim. A deserção destes, foi notória.
Não há um único meio ao alcance das pessoas mais esclarecidas e por
isso, "non gratas" pelo establishment, onde possam dar luz a novas
ideias e à realidade do seu país, envolto no conveniente manto diáfano
que apenas deixa ver os vendedores de ideias já feitas e as cenas
recomendáveis para a manutenção da sensação de liberdade e da prática
da apregoada democracia.
Só uma comunicação não vendida e alienante, pode ajudar a população, a
fugir da banca, o cancro endémico de que padece, a exigir uma justiça
mais célere e justa, umas finanças atentas e cumpridoras, enfim, a
ganhar consciência e lucidez sobre os seus desígnios.
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